Brassagem: como escolher?
Saiba qual a brassagem ideal para o seu negócio
Sabia que este equipamento deveria ser a última preocupação de quem vai montar uma cervejaria pela primeira vez? Isso acontece porque ao alocar um grande recurso financeiro em uma única máquina, pode faltar capital pra outras demandas prioritárias na construção do negócio como, por exemplo, estrutura de vendas ou de galpão. Aqui na Embu, (in)felizmente, já vivenciamos essa experiência com nossos clientes mais de uma vez.
Como já mencionei em outro artigo, o grande gargalo da cervejaria é “vendas” e, quando não há liquidez de capital para investimento em 100% do negócio de uma única vez, o mais sensato é começar a cervejaria então de “trás pra frente”: primeiro gere demandas de vendas e, só depois, invista na fábrica.
Minha primeira vez avaliando uma máquina de brassagem – em 2016- foi um processo de mais de 6 meses de avaliação e estudo até, enfim, eu me sentir segura para tomar uma decisão. Claro que, olhando pra trás, eu sei que fizemos o melhor possível considerando os recursos que eu e meu cliente tínhamos em nossas mãos na época e o acesso à informação que me foi permitido enquanto consultora. Entretanto, não é uma máquina que eu indicaria novamente para compra, principalmente, porque atualmente temos muito mais opções no mercado. Que máquina foi essa? Uma brassagem bi-bloco, encamisada, com aquecimento elétrico e uma válvula direcionada para o operador. Vamos por partes, ok?
A brassagem bi-bloco parecia um sistema muito inteligente já que era composta por duas únicas tinas e, uma delas, executava duas funções distintas: na mesma tina em que era realizada a mostura, também acontecia a fervura. Já a segunda tina era de uso exclusivo para filtração. O fato de a máquina apresentar apenas duas tinas reduzia muito o custo de fabricação dela e, consequentemente, o seu preço final de venda. Entretanto, a grande dificuldade que enfrentaríamos era o aquecimento e preparo da água de lavagem de mosto: de onde ela viria? Pra resolver esse problema de aquecimento foi necessário um investimento extra equivalente ao valor de investimento em um tanque de fermentação de 1.000L na época (algo em torno de R$20.000,00 - considerando tanque extra, bomba, mão de obra, tubulações, fretes, etc.).
Quanto ao aquecimento elétrico, foi preciso embuti-lo na camisa da tina, já que a fiscalização do MAPA na região, quando consultada, recusou o aquecimento do mosto direto em uma resistência elétrica (independente do seu material de constituição). Qual o problema disso aqui? A resistência elétrica “embutida” na camisa de um tanque nada mais é do que transformar a tina em um grande equipamento de “banho maria”. Em função disso, o tempo de aquecimento do mosto era prolongado.. resultando em alto consumo energético e, consequentemente, alto custo de energia elétrica por litro de cerveja produzido.
E, pra finalizar, ainda havia aquela válvula direcionada para o operador. Qual o problema nisso aqui? Risco de acidentes para quem operava e manobrava válvulas neste esquipamento. Eu mesma viria a me acidentar no futuro.
Veja bem, investir em uma cervejaria representa a realização de sonho de muitos e, por isso, toda decisão precisa ser minuciosamente avaliada visando sempre a mitigação de riscos: segurança física das pessoas, segurança financeira, segurança emocional, redução de custos, retorno em curto e longo prazo. Na tentativa de “pagar menos” aqui e ali, ao final, o preço sempre sai mais caro. Incomum? Não! Essa busca por “economia porca” – me desculpe o palavriado, é mais comum do que parece. O problema não é buscar economia, o problema está em “como” essa economia é avaliada: escolher a máquina avaliando apenas o preço final dela. Pior que isso é não considerar a sua realidade ao tomar decisões: nessa situação que apresentei, não havia disponibilidade de investimento para curto prazo em energias alternativas como, por exemplo, placas solares, com o objetivo de reduzir consideravelmente o custo da energia por litro de cerveja produzida. Dessa forma, o mais sensato seria re-avaliar a forma de aquecimento da máquina, já que o aquecimento elétrico seria custoso à longo prazo.
Para que você também não passe por essas dificuldades de principiante e tenha mais clareza profissional quanto à escolha da sua brassagem, aqui vai algumas dicas para você usar como ferramentas na sua tomada de decisão:
as soldas internas da máquina devem ter “acabamento sanitário”, isso significa ser um acabamento liso, sem arestas e frestas para depósitos de matérias orgânicas, inorgânicas e micro-organismos. Uma forma simples de avaliar a solda é fazer um “teste de algodão”, o que nada mais é do que passar um algodão na solda. Se o algodão soltar “fiapos”, a solda não é sanitária;
o material de constituição da máquina que entra em contato direto com a bebida deve ser do tipo “alimentício”, ou seja, deve ser próprio para uso em produtos de consumo humano. O mais comum e indicado para brassagens? O famoso INOX 304. Isso vale para as paredes internas das tinas, tubulações, bombas, etc.;
previna-se contra acidentes avaliando os riscos operacionais da máquina: há válvulas direcionadas para operadores? Há válvulas com acesso à tubulações de diferentes etapas de processo que se comunicam se abertas juntas (por exemplo, se for o caso de você estar realizando limpeza em uma tina e realizando mostura em outra tina.. há alguma válvula que se for aberta por acidente, vai misturar produto químico de limpeza com bebida)?;
as máquinas precisam ser fabricadas conforme padrões ISO e terem um responsável técnico por ela: há um databook para este equipamento? Há um laudo técnico de uma engenheiro responsável? O projeto técnico da máquina tem um engenheiro responsável?;
avalie os grandes custos de operação da máquina: custo com agente químico para limpeza, tempo de operação, custo com fonte de aquecimento.. Para deixar claro, “avaliar” não significa perguntar pro fornecedor, conversar com amigos e parar por aí. “Avaliar” significa consultar dados, organiza-lós em uma planilha e cruzar essas informações. Contra fatos, não há argumentos! Para ajudar você nessa etapa, nós elaboramos uma planilha simples e fácil com os maiores custos envolvidos na operação de uma brassagem. Você pode fazer o download gratuito clicando aqui.
Nesta planilha, nós apresentamos os maiores custos de operação de 7 tipos de brassagens diferentes: single vessel, tri-bloco de primeira linha, tri-bloco de segunda linha, tri-bloco de terceira linha, tetra-bloco de primeira linha, tetra-bloco de segunda linha e tetra-bloco de terceira linha. Para avaliar os custos operacionais das brassagens, todos os cálculos foram feitos considerando uma produção mensal de 5.000 L de mosto. As máquinas de primeira, segunda e terceira linha foram classificadas dessa forma considerando nível de tecnologia (automação), eficiência, constituição da máquina, qualidade do acabamento e experiência prática da nossa equipe com cada uma delas. Todos os dados de consumo para as máquinas foram preenchidas conforme orientado por fornecedores, entretanto, por ética, os fornecedores não serão revelados. Para melhorar a sua experiência, você pode consultar os comentários e dicas que foram adicionados na maioria das células da planilha.
Nesta planilha que aprestamos, você vai observar que é preciso apenas R$60.000,00 de investimento em uma single vessel de aquecimento elétrico que faça 5.000L de cervejas por mês e, ainda, que o custo de operação dessa brassagem single vessel de aquecimento elétrico ao longo de 5 anos é R$383.532,95. Em contra partida, são necessários R$400.000,00 de investimento para uma tetra-bloco de primeira linha que faça os mesmos 5.000L de cervejas mensais, enquanto o custo de operação dessa brassagem tetra-bloco de primeira linha, ao longo de 5 anos, é R$142.796,59. Ou seja, a diferença de custo de operação entre as máquinas é igual a R$240.736,36. Já pensou no investimento que você pode fazer através de um empréstimo com esse valor de custo de operação da máquina? Afinal, são quase duzentos e quarenta e um mil reais.. É válido apontar que essa planilha foi elaborada no ano de 2021 e, por isso, os preços da unidade de energia elétrica, água e malte, não estão atualizados para o ano de 2022. O que só torna o cenário pior e aumenta a necessidade de avaliação de cada um destes custos.
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Dicionário Cervejeiro Industrial:
TINAS: palavra técnica para referenciar uma “panela” de uso industrial. Ao invés de dizermos “panela de mostura” ou “panela de fervura”, por exemplo, na indústria nos referimos à estas máquinas como “Tina de mostura” e “ Tina de fervura”.
MITIGAÇÃO DE RISCOS: medidas rigorosas e flexíveis aplicadas para combater as vulnerabilidades à risco financeiro da aquisição de uma máquina, no caso do nosso artigo.
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